Brenda Paula Figueiredo de Almeida Gomes

Brenda Paula Figueiredo de Almeida Gomes, a cientista que investiga a efetividade dos tratamentos odontológicos

Por Vitória Régia da Silva

Por alguns anos, foi a única professora do departamento em que atua, na FOP/Unicamp; para ela, ainda hoje há desafios para as mulheres ocuparem espaços na área da saúde

A cirurgiã dentista e pesquisadora Brenda Paula Figueiredo de Almeida Gomes é uma das principais referências no país do estudo da morfologia interna dos dentes e dos fatores envolvidos no sucesso dos tratamentos endodônticos, também conhecido como tratamento de canal. Pesquisadora e professora da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas (FOP/Unicamp), a mineira atua na área de Endodontia, a especialidade da Odontologia onde estão preservação do dente, prevenção, diagnóstico, prognóstico e tratamento da polpa dentária, além de todo o cuidado com o sistema de canais radiculares e dos tecidos periapicais.

Coordenadora do laboratório de Microbiologia e Biologia Celular Aplicada à Endodontia da Unicamp, a cirurgiã dentista é a única autora de Projetos de Pesquisa Temáticos da Fapesp (2016-2021) na área de Endodontia, de 13 projetos em andamento na área de Odontologia, mais especificamente. O auxílio para projetos temáticos tem duração de cinco anos e é destinado a “apoiar propostas de pesquisa com objetivos suficientemente ousados”, segundo a Fapesp. A pesquisadora tem seu trabalho reconhecido na área, acumulando premiações em congressos nacionais e internacionais. No Brasil, ostenta um Prêmio CAPES de Tese, recebido em 2008 – pela melhor produção, segundo avaliação da Capes, na grande área das Ciências da Saúde e Ciências Agrárias – e um Prêmio de Reconhecimento Acadêmico Zeferino Vaz da Unicamp. Sua atuação extrapola a academia e a fez uma “cidadã notável”: Em 2017, a pesquisadora também foi homenageada na Câmara de Piracicaba (SP) pelo “Dia do Professor/Dentista do Ano”.

“No começo da minha pesquisa, eu investiguei como era formado o canal radicular e o que pode causar alterações no paciente”, destaca. Hoje, a pesquisadora também investiga a efetividade do tratamento odontológico realizado: “É importante saber se a nossa técnica ou tratamento está sendo capaz de eliminar a maior parte das bactérias sem causar problemas ao paciente. A ciência e a tecnologia evoluem para proporcionarmos tratamentos mais rápidos e eficientes, e precisamos estar monitorando a eficiência do que está no mercado”, pondera. O tratamento dos canais radiculares é o procedimento para remover bactéria e tecido morto, ou quase morto, da polpa do dente.

A pesquisadora que nasceu em Varginha (MG), onde teve a educação infantil até o técnico em Química, fez sua graduação em Odontologia na Pontifícia Universidade Católica (PUC) de Belo Horizonte e especialização e mestrado em endodontia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) antes de fazer seu doutorado fora do país. Sua principal linha de pesquisa é a microbiologia aplicada à endodontia, que iniciou desde o seu doutorado no Hospital Universitário de Manchester na Inglaterra, com a tese “An investigation into the root canal microflora – Uma investigação sobre a microflora do canal radicular”.

Durante o doutorado, sua pesquisa se concentrou nas técnicas de cultura [metodologia usada para estudar características dos organismos como a capacidade de crescer em meio seletivo] visando microorganismo anaeróbios [organismos que não necessitam do oxigênio]. O estudo foi realizado por meio da coleta de amostras microbiológicas dos canais radiculares de dentes com necessidade de tratamento endodôntico, associado bactérias específicas com os sinais e sintomas de origem endodôntica. Era algo pouco aprofundado no Brasil, por mais que existam diversas pesquisas de qualidade relacionadas à Endodontia. Após seu retorno ao Brasil, foi convidada pelo Professor Dr Luiz Valdrighi, pesquisador responsável pela área de Endodontia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Unicamp, para conhecer o setor, entrar para o pós-doutorado e reestruturar o laboratório de microbiologia aplicada a Endodontia. Desde então, é docente da Universidade.
Desde a sua volta, em 96, aperfeiçoou sua metodologia, e hoje trabalha com técnicas moleculares. Gomes destaca que seu trabalho também se propõe a verificar como a técnica contribuiu para a qualidade de vida do paciente. “Hoje temos a preocupação de conhecer os microrganismos e seus fatores de virulência [capacidade de um vírus ou bactéria de se multiplicar dentro de um organismo, provocando doença] e também se esse conteúdo tóxico e infeccioso tem contribuído para aumentar a inflamação presente nos tecidos periapicais [fora do canal radicular]”, destaca Gomes. Para isso, monitora cada etapa do tratamento endodôntico, testando novas técnicas de instrumentação que sejam capazes de tocar mais nas paredes infectadas dos canais radiculares.
“Os trabalhos em andamento no nosso laboratório visam investigar os efeitos das doenças sistêmicas sobre essa microbiota presente nos canais radiculares e no reparo após tratamento endodôntico. Sabendo o que está presente e causando a infecção ou doença, podemos combatê-la de uma maneira mais eficaz”, conclui.

Corpo docente masculino, mas discente feminino

Docente da Unicamp há mais de 20 anos, a professora recorda como na sua trajetória sempre foi orientada por professores homens, com destaque para o Prof Dr. Nicola Tancredo, que faleceu em 1993, e foi responsável pela Especialização e Mestrado em Endodontia e a incentivou a prestar o concurso para o Mestrado da Faculdade de Odontologia da UFRJ. No ensino superior, como observa a pesquisadora, são eles quem compõem a maior parte dos docentes da sua área. Na sua graduação, Gomes recorda de professoras apenas nas áreas básicas do curso de Odontologia, como na Bioquímica, Histologia, Citologia e Microbiologia. Nas áreas clínicas, só teve professores.

“A Odontologia é um curso onde a maior parte do corpo discente é feminino, enquanto a maioria do corpo docente é masculino”, atesta. “Quando eu entrei na FOP, na minha área, eu era a única professora. Somente em 2015 entrou a minha colega Adriana de Jesus Soares e, dois anos depois, a pesquisadora Marina Angélica Marciano. Atualmente na FOP ainda predominam docentes do gênero masculino, embora isso esteja mudando.”

Ela sabe que essa disparidade de gênero não acontece somente na sua área, que esse padrão é repetido, o que revela obstáculos de ser mulher na Academia. “Existe ainda a dificuldade de sermos aceitas como mulheres em um mundo de homens. O cenário está mudando, mas ainda não é o ideal. O nosso desafio é ser aceita na nossa profissão, já que o meio acadêmico continua sendo masculino e precisamos lutar para abrir esse círculo para as mulheres.”

Cientista com pesquisa consolidada e com contribuição importante para a saúde, Gomes é uma dessas mulheres que conquistaram o seu lugar, e que, certamente, já inspira alunas e outras mulheres. Já orientou até o momento onze doutorandos, sendo mais da metade mulheres.

Brenda Paula Figueiredo de Almeida Gomes
UNIVERSIDADE DE DOUTORADO
Universidade de Manchester, Inglaterra
ÁREA DE PESQUISA MAIS RELEVANTE
Odontologia
TÍTULO DA PESQUISA
Microbiomes of Endodontic-Periodontal Lesions before and after Chemomechanical Preparation
ONDE VIVE
Piracicaba (SP)
O QUE NÃO PODE FALTAR NA CIÊNCIA BRASILEIRA?
Motivação e financiamento